Chamada missionária e família: uma opção “Ubuntu”
Um missionário deve abandonar a sua família para responder verdadeiramente ao chamado de Deus para alcançar os perdidos? Em todo o continente, uma nova geração de missionários africanos estão a ir, e as suas famílias nem sempre compreendem as razões. Pode parecer egoísmo, especialmente quando a família se sacrificou para proporcionar educação e cuidados, esperando as retribuições mais tarde. Pode parecer abandono quando os idosos são deixados sozinhos sem os filhos adultos para cuidar deles.
O chamado missionário
Nem toda a gente é chamada para as missões da mesma maneira. Seja qual for o caminho, uma pessoa ou um casal acaba por chegar à decisão de que Deus quer que eles saiam e ministrem. Esta decisão deve ser confirmada através da consulta à conselheiros espirituais maduros e de confiança.
Nesta altura, a família é informada da decisão, o que pode resultar na confirmação dos seus piores receios: o seu filho tornar-se-á um pedinte, poderá ser morto numa terra estranha, ou ter filhos que nunca conhecerão os seus avós. O inicial investimento na educação é agora visto como um mau investimento. Infelizmente, o pastor local pode por vezes ser um dos maiores obstáculos ao futuro missionário, com protestos sobre as necessidades locais, dúvidas sobre o chamado, ou os seus próprios receios sobre o dinheiro em sair da igreja para uma terra estrangeira.
Ubuntu e missões
Consideremos uma alternativa usando a filosofia africana do Ubuntu. Ela está relacionada com a frase Zulu “Ubuntu ngumuntu ngabantu”, que significa que uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas. Será que não podemos aplicar isto ao chamado missionário? Será possível que Deus dirigiu o chamado tanto para o indivíduo como para a comunidade que o rodeia?
O Dr. Dennis Kilama, num *artigo para The Gospel Coalition Africa, comenta: “Recuperar o Ubuntu na Igreja seria uma forma de recuperar a visão do Novo Testamento para a comunidade cristã. Esta é a atitude de que tudo o que fazes tem impacto nos outros: o que afecta um afecta todos. O sucesso do grupo está acima do sucesso do indivíduo.
E se o sucesso missionário fosse considerado o sucesso de toda a comunidade e não o sucesso de um indivíduo que trabalha no campo da colheita? Imaginemos uma comunidade que ouve o chamado de Deus para o seu amado. Orem pela confirmação, vêem que ele está devidamente formado, e é apoiado enquanto serve na missão. Acolhem o seu amado quando ele regressa a casa para descansar, e encorajam-no enquanto ele se prepara para regressar. A comunidade reúne-se à volta dos membros da família que, na ausência do missionário, precisam de ajuda, seja ela financeira ou outra. Não seria esta um expressão do Ubuntu? Leia como a família e a comunidade da Grace Djanie* (nome fictício) fizeram exatamente isso.
A história da Grace
Já ouvi histórias de pais que eram contra o chamado missionário dos filhos, mas a minha experiência foi diferente. Quando informei os meus pais pela primeira vez, o meu pai sorriu. A minha mãe disse “É um privilégio servir o Senhor”. Eles nunca questionaram as minhas intenções nem me desencorajaram. Houve momentos em que não tinha a certeza se esta era a vontade de Deus, mas eles estavam sempre disponíveis para falar e orar comigo quando eu precisava.
Antes de ir para o campo missionário, formei um grupo de intercessão para orar por mim todas as semanas no Zoom. Os meus pais participavam de forma concistente. Quando parti para o campo, o meu irmão coordenou o grupo na minha ausência. Demiti-me do meu emprego para me preparar para o campo, e os meus pais acolheram-me durante um ano inteiro. Tomaram bem conta de mim e nunca se queixaram da minha incapacidade de ajudar na manutenção da casa. Pelo contrário, deram-me uma quantia substancial de dinheiro para o campo.
Cerca de 80 pessoas assistiram o meu serviço de comissionamento. Toda a minha família estava lá – os meus pais, o meu irmão, a minha irmã, o marido dela e os seus três filhos. Os meus amigos, membros da igreja, antigos colegas de trabalho, e líderes da missão também estavam presentes. Eles proferiram palavras de afirmação sobre mim e abençoaram-me. O proprietário de uma empresa incluiu-me na sua folha de salário para me enviar apoio mensal como um dos seus trabalhadores, incluindo pagamentos para os meus benefícios de reforma – isto foi um milagre!
No dia da partida, a minha família me levou no aeroporto. O apoio da minha família, dos meus amigos e da comunidade cristã deu-me força para responder o meu chamado missionário. As palavras do meu pai no meu culto de comissionamento descrevem o coração por detrás do imenso apoio que recebi: “Tal como Maria, a mãe de Jesus, sentimo-nos muito honrados por o Senhor ter escolhido a nossa família para esta grande tarefa.”
* https://bit.ly/3NAioi9